sábado, 29 de março de 2014

24 Horas de Felicidade



Isso parece possível para você?

Eu responderia que não.

Pharrel Williams traz essa proposta com sua música Happy, e ousou muito ao criar o primeiro clipe de 24 horas de duração, em que várias pessoas dançam e se divertem ao som da música, que toca infinitamente e cada pessoa tem seu jeito de expressá-la. Vai sentindo cada momento da música, e dá para perceber que muitos movimentos são repetidos, às vezes eles ousam em seus movimentos.

Quando comecei a assistir continuamente o clipe de 24 horas, me levaram para 11:36 e topei com três idosas muito simpáticas que dançaram juntas por uma caminhada de quatro minutos e se divertiram bastante, queriam mostrar novos movimentos, desciam até o chão e gesticulavam o que conseguiam!

A música traz em sua letra uma sequência que transmite a questão da liberdade de expressão, o desejo de se expressar, as pulsões para serem liberadas. Há um alerta sobre essa possível loucura, mas que é normal, não é algo de outro mundo, é apenas algo imenso que existe e que vai além de compreensões simplistas e longe do movimento de alteridade. E não há ofensa a esse outro que não compreende, é só porque há realmente essa felicidade de alguém que sabe que quer emiti-la

Para alguém que gosta de dançar e às vezes tem vontade de fazê-lo na rua, isso é muito interessante, pois o espaço físico está ali, mas o simbólico não. Parece que as ruas são feitas apenas para andar, esperar, não para observar, ter lazer, se divertir, dançar, brincar. As calçadas tentam ser funcionais [o problema está no fato também de termos calçadas estragadas, estraçalhadas, desniveladas].

Essa dimensão material da rua é o primeiro ponto a ser observado tanto por reflexões quanto pelo olhar da Administração Pública. Se não conseguimos nem usá-la de forma funcional para atendermos à demanda de trabalho e estudos, nosso dia a dia se torna mais complicado por pequenas coisas que trazem desconforto e podem impedir certas realizações pessoais. Especialmente deficientes e idosos têm dificuldade de locomoção em nossas calçadas, em nossas ruas. As faixas, os semáforos, as rampas que faltam, são estruturas simples que faltam aos que se locomovem.

Simbolicamente percebemos olhares e estranhamentos com as ações que saem do comum. Não é ANORMAL, é incomum. Anormal é se reprimir porque há uma repressão social, e é essa a maior castração desnecessária. O olhar estranho para aquele que dança na rua é o reflexo da vontade social de repressão aos corpos. A expressão do corpo é forma genuína de liberação de desejos. Dançar é um movimento pessoal, não excede essa esfera.

A cidade se mostra hostil frente às subjetividades das pessoas. E essas subjetividades devem ser respeitadas. Não passamos por um processo de alteridade frente aos corpos dos outros, em que se respeita essa liberdade de expressão individual. O clipe de Pharrel Williams é um dos maiores manifestos visuais sobre essa liberdade, em que se usa a cidade na maior parte do clipe como cenário para concretização desse desejo de expressão. Essa liberdade está garantida constitucionalmente. Há uma norma que a permite. Mas as normas de repressão simbólicas, olhares, gestos, falas, ainda se encontram num sentido de repúdio.

A cidade é espaço de liberdade de expressão artística.

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